E como se não tivesse chegado o momento, sabe? Aquele instante parecido com o lusco-fusco? Precipitei-me até o corpo dele, inerte, adormecido sobre todas as desvantagens, e o beijei... Na boca! Sem medo que ele despertasse, consigo a sensação que procurava: sem ar, uma alegria triste, um afago ininterrupto, ausência de sons e realidade. Ainda fiquei a meio centímetro de sua boca, tentando sorver o máximo do hálito, suspirado em camadas finas de ar... Eu tentava, desesperadamente, beber a sua respiração, com a devida certeza que levaria sua alma pra dentro de mim. (suspiro, tempo) Ele sorria... Sorria e abria os olhos, como a caçoar. A gargalhada imensa, metálica, surgia insuportável, cruel mesmo. Qual é o gosto da minha boca, há quanto tempo esse sentimento? Eu não sabia o que dizer, temia emporcalhar com palavras aquele instante tão meu, tão perto da descoberta do amor real. Eu só sabia da precipitação. Ele não dormia, fingia. Uma traição. Então, ele ergueu de um salto, sacudindo meus ombros... É uma trepada que você quer? Isso não nos fará mal. Eu trepo com você. Mas não me beija, que eu tenho nojo. E... assim, como no lusco-fusco, ele me beijou...
Relato: Ademir Esteves